Eu sempre quis me envolver com as coisas de Deus, sempre esteve em meu coração andar ao lado do Senhor. Claro que isso não cabe a mim escolher, pois é de inteiro proveito apenas dEle, e somente Ele pode escolher de quem Se acompanhar. Com espírito intrépido, porém, eu me apaixonei pelas coisas dEle. Vi propósito, beleza, motivo. Por isso, quando ouvi o Seu chamado, quando eu soube que Ele me amava e aos meus ouvidos foi possível compreender que Ele vive, que Ele fala, que Ele age, imediatamente lancei-me aos Seus cuidados.
Todavia, estar próximo de Deus, ou com as coisas dEle se envolver, não é tão simples. Além de toda renúncia, requer fibra, determinação, caráter, compostura, domínio próprio. Vagarosamente eu percebi que as qualidades apontadas por Paulo em Gálatas 5:22, ao tratar do fruto do Espírito, não se tratavam da manifestação de uma ou de outra em particular, adjetivando a vida de alguém, sim da conexão de todas, criando o alicerce da nova vida em Cristo e determinando qual deve ser a conduta de um cristão. Ora, assim como é com a carne, que jamais manifesta apenas a cobiça, antes, esta é seguida da inveja e da porfia, ou seja, um pecado chama outro pecado, então, uma correção deve atrair outra correção, e assim prosseguimos (Ef. 4:24).
Como se já não fosse difícil demais tratar a própria personalidade, corrigir os próprios hábitos, modificar os costumes e enobrecer o caráter, some-se as lutas atravessadas, diariamente, contra nós mesmos. É certo que o maior inimigo do homem é ele mesmo. Remontar princípios e abandonar vícios é muito doloroso, e a velha natureza sempre clama por sobrevivência. O adversário joga com as fraquezas individuais e contra ele devemos sempre estar preparados e buscar vigiar, como quem atina antever o passo seguinte, a fim de não cair em tentação. Contudo, o grande adversário que todos os dias enfrentamos somos nós mesmos. Entendo o que Sartre quis dizer quando afirmou que “o inferno são os outros”.
Jesus ensinou que nenhum reino dividido subsiste (Mt. 12:25), esse é um princípio lógico, porque famílias sempre se destroem quando se dividem nos objetivos, nos valores e no caráter. Tal princípio é válido para todos os meios, como em uma empresa, que não tolera divisão e competitividade; para um casamento, que não suporta discussões diárias; em um paraíso, que bane o Diabo dos seres eternais; em uma igreja, que acaba criando outra denominação. Enganam-se os que acreditam que o reino das trevas é dividido pela ânsia de poder. O mal é muito organizado, se não o fosse não trabalharia em conjunto (Mc. 5:9; Ap. 11:7; 13:1, 11; 15:2). Quando os lados foram escolhidos, na batalha primeira, os anjos caídos fizeram de Satanás o deus deles.
O plano maquiavélico do Diabo é entorpecer a mente humana com informações inverídicas. Assim, todos imaginam uma grande desorganização nas potestades infernais, algo propositadamente forjado por demônios, a fim de que o combate seja direcionado a demônios que pareçam mais fortes, quando, na verdade, eles distraem a vigilância enquanto o Diabo tenta investidas por outros caminhos. Caso o inferno fosse tão dividido como pintam, então, ou ele já estaria destruído de acordo com a Palavra de Jesus, ou Jesus É mentiroso. Como descarto completamente estas hipóteses, percebo que a Palavra de Jesus é verdadeira e que o Diabo ilude aos demais com artifícios bem sagazes.
Em tantos de seus métodos o mais comum é criar divisões e barreiras no meio das igrejas, tornando-as isquêmicas e frágeis, a fim de que nos auto-destruamos. Um plano simples e de grande resultado. Ora, assim como fez com as famílias, criando o ativismo feminista e abrindo sulcos para atividade laboral da mulher no mercado, o que gerou conflitos familiares, readaptação de convivência, abandono de valores bíblicos, desprezo aos cuidados com os filhos, etc., então, da mesma maneira, o Diabo faz nos dias presentes com a igreja.
Suportar-nos () tem se tornado em um feito nem sempre acompanhado de amor. Isto se deve às tantas perseguições, aflições, investidas, calúnias, difamações, competições, tantas atividades degradantes que nós mesmos investimos uns contra os outros. Por que não sabemos reconhecer o dom na vida de nosso irmão? Por que não sabemos respeitá-lo e amá-lo como é da maneira que Deus o usa? Por que queremos que tudo seja do nosso jeito e quando não é conosco nos enciumamos, até nos intrigamos? O que há de errado conosco? Quando vamos perceber que estamos divididos e que a multidão de denominações não é sinal de benção, mas, de maldição?
Inexiste benção no que é divisão. Tudo o que começa dividido permanecerá dividido, até que seja corrigido (Pv. 28:13). Estamos olhando para os próprios umbigos e, por isso, não conseguimos enxergar além de nossos próprios desejos. Quem nós pensamos ser para julgarmos nossos irmãos e uns aos outros? Lembro de uma igreja que visitei, para a qual fui convidado a falar acerca de meu ministério docente. Quando lhe falei acerca do infortúnio de meu primeiro casamento, olhou-me atravessado e ignorou-me completamente. Ora, o que ele sabe de mim para julgar-me apenas porque minha primeira esposa me abandonou? O que ele sabe de meu sofrimento e do quanto investi para preservar aquele matrimônio? O quanto ele sofreu comigo para se pôr acima de minha pessoa? Quem o fez juiz sobre mim (Tg. 4:11)?
Chega. Basta. É preciso parar. O céu não é comprado para que alguém se ache no direito de dizer quem pode e quem não pode entrar lá. Este costume de medir o que se tem a mais que o outro é cainita (Gn. 4:3-7), maldição de querer medir qual a melhor oferta; ou farisaico, para buscar medir quem é melhor do que o outro (Lc. 18:10-11). Eu sempre tive e tenho uma vida limpa. Cheguei ao meu casamento virgem, enquanto dos que me atiram pedras, muitos deles, nem sequer se guardaram para o matrimônio. Chega de hipocrisia, ninguém pode saber o que o outro passou na vida com duas horas de conversa. Acho que todos já viram o suficiente do que ocorre quando o homem quer manipular as coisas no lugar do Espírito de Deus: incontáveis escândalos.
Jesus já tinha advertido contra esse tipo de religiosidade (Mt. 23:13). O céu é para todos os que crêem (Lc. 14:22, 23; Jo. 3:16). Pregamos sempre sobre esses versículos, porém, eles só se tornam válidos para abarrotar a igreja de dizimistas. No fundo está em pauta a vaidade ministerial, e não a preocupação com a salvação do perdido. Esse terrível hábito invadiu a igreja, e hoje todos se encontram divididos. Apenas uma leve discussão é o suficiente para que líderes rompam e seja aberta mais uma denominação. Ora, até casais brigam, isso é natural. Seria anômalo que, durante toda a vida, jamais as pessoas discordassem entre si mesmas. Porém, os cristãos parecem ser de cristal, nada pode ser dito.
Para os cristãos uma simples palavra quebra todo o vidro, e logo é motivo para não mais freqüentar determinada igreja. Hipocrisia, porque no mundo se suporta as maiores afrontas, por emprego, por amores, por dinheiro. Todavia, para Jesus, ninguém está disposto a suportar absolutamente nada. Isso é intrigante, porque apesar de as pessoas não estarem dispostas a mudar ou a sofrer por Jesus, em apelos missionários elas vão a frente dispostas a morrer por Jesus. Outra hipocrisia, porquanto se não é possível mudar um simples ato e costume, o que dirá de morrer por amor ao evangelho? Improvável. O princípio bíblico não são as grandes coisas, mas, as pequenas que demonstram o coração da pessoa (Mt. 25:23).
É por isso que quando se trata de ministério, a maioria das pessoas estão consolando a própria vaidade, e não cumprindo as tarefas de Cristo. Todos começam com uma boa intenção, a vontade de obedecer. Quando o ministério ganha um escopo mais corpóreo, dia-a-dia, aqueles joelhos que se dobravam para tudo perguntar a Jesus antes de qualquer atitude, passam a se dobrar sempre menos. Quando não é assim, o discernimento é corrompido pela necessidade de manter o ministério em certo nível ou padrão, então, o que se prometia antes jamais fazer durante o ministério, passa a ser feito com muita vazão. Inobstante, o medo, a vaidade, a inveja, e tudo passa a ser manipulado pelo homem, não mais por Deus.
Esta é uma grande questão no chamado: você tem feito o que é bom para Deus ou o que é bom para o seu ministério? É uma pergunta séria, porque o bom para Deus é que a verdade seja pregada além dos caprichos ególatras; sermões de admoestação e de eternidade, não sermões omissos ou materialistas. Saber o que seria bom para Deus, o que Ele pensa de Sua igreja, não é uma tarefa fácil, porém, seria bom iniciar com a manutenção da homilia, promovendo a permuta por sermões bíblicos e cristocêntricos, ao contrário de tanto antropocentrismo, sermões que visam a satisfação do “cliente”, e não que alertem o rebanho quanto a realidade espiritual bíblica.
Esta semana estive pregando em algumas igrejas. Confesso que ando um pouco abatido e triste. Eu venho padecendo perseguições e afrontas que têm arrancado um pouco da minha atenção. O ministério, para quem está de fora, parece prazeroso, mas, para quem está de dentro, é feito com muito esmero. Bem, em uma das igrejas nas quais preguei, uma garotinha foi a frente, quando terminei o sermão, para me abraçar. Ela se convertera noutro sermão em outro dia e em outra igreja. Agora, então, ela foi e falou-me: “O senhor lembra de mim? Foi em seu ombro que eu chorava quando entreguei minha vida a Jesus”.
A frase da garotinha foi o suficiente para arrancar de mim um brado de conquista, um ato de vitória, um consolo. Eu, que me encontrava fatigado de tanta carne, de tanto homem, de tanto hipocrisia, senti-me renovado instantaneamente. As aflições que padecemos nesta carne, se forem para que almas sejam salvas, elas valerão o esforço e cada situação, por pior que pareça. A vida ministerial não é medida pelo tamanho da igreja, ou pela quantidade de sermões pregado no ano, ou pelos inúmeros convites recebidos por mês… não, por nada disso. A vida ministerial é medida pela gratidão das pessoas que, quando tocadas, decidem nascer de novo para a Glória de Cristo. Isso é ministério: um repovoamento celestial e um êxodo infernal.
As quatro paredes de uma igreja não representam um ministério. Alguém já disse: “Há pessoas que tem um pastorado, e há pessoas que têm um ministério”. Um ministério não são paredes, são vidas. Por isso, pense nas vidas que se esforçam para estar ao seu lado, próximo a você, que agradecem, que se transformam. O único meio de sabermos o grau de aceitação de nossos sermões é através dos frutos daqueles que nos ouvem (Mt. 7:16). Ora, presenciar os frutos é ter a nítida informação de que, ainda que a longo prazo, está dando resultado, está dando certo.
Conversei sobre diversas coisas hoje e espero não ter chocado você mais do que pretendo fazê-lo agora. O cinismo entre o “povo de Deus” é tão ferrenho que tomei a decisão de não ser mais evangélico, nem pastor, nem missionário. Eu tomei a decisão de ser cristão e de procurar pessoas que, como eu, queiram renovar a lavra ministerial e refinar o trigo por meio da Verdade. Estou cansado de tanta hipocrisia, de tanta politicagem. Exauriu-me as forças contemplar os próprios irmãos lutarem uns contra os outros, e muitos contra mim. Acredito que necessitamos de novidade. Já não tenho paciência de ir em livrarias evangélicas e ver sempre os mesmos assuntos discutidos por autores diferentes. Isto é feito apenas pela venda, pelo comércio, e não porque exista a compreensão de que aquilo, também, é um ministério.
As editoras, os cantores, os escritores não têm mais a responsabilidade de alimentar o povo de Deus, já que o louvor e a leitura são ferramentas dos ministérios de discipulado e libertação. Eu quero poder falar a verdade sem me importar com os que não a querem ouvi-la (II Tm. 4:3). É meu dever, eu fui chamado para isso. Espero que você, também. Deus te abençoe.
Pr. Túlio Jansey